quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Antes que Seja Tarde

Cada passo dado durante dia
Ecoa, mais tarde, na noite fria.

Mostra-nos a palavra não dita.
Deixam algumas mentes aflitas
Com o que podia e não aconteceu.

E eu, prefiro mesmo é correr
Para, no fim do dia, não ter
Que, frustrado, dizer
Que não deu.
Só quero a chance de poder
desfrutar tudo o que é meu.

Tome aquilo que é seu
Antes de perder.

Quadrilha



João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para o Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Soneto à beleza

Vou falar de uma bênção da natureza,
Da dádiva que vem para roubar
O foco e a atenção do nosso olhar.
Quero falar da deslumbrante beleza.

É ela o prêmio da conquista;
O mais valioso tesouro da batalha;
É o gume separador da fria navalha;
A fonte de inspiração do artista.

É o polo magnético que indica a direção.
Está na realidade ilusória de imaginação.
A escuridão misteriosa, tranquila e assustadora.

Também é a violência do inocente.
Está nos olhos do que vê ou do que mente.
É a força da destruição, sutil e inovadora.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Memórias de um Solitário

Que paradoxo era ele.
E que defeito era aquele?!
Era algo de humilhar
Ele não saber abraçar.
Como podia ser amado?
Alguém ficaria ao seu lado?

Sempre acontecia,
Como testemunhei um dia,
De alguém dele se encantar.
Porém, ele sabia o que esperar.
Sentia bem perto o fracasso:
A hora do abraço.

O que havia de errado?
Tinha o corpo bem formado.
Nada nele faltava.
Nada nele excedia.
Era gentil, correto, exemplar.
E não sabia abraçar.

Por isso todos o evitavam.
Mas eles não o odiavam.
Possuia uma beleza singular,
Pureza e profundidade no olhar.
Só não sabia abraçar, infeliz.
Amar foi o que sempre quis.

Sua dor crescia ainda mais no peito.
"Como corrigir tal defeito?"
Ficava a se perguntar.
Com todo empenho tentou concertar
O erro, a destruição da sua vida
E deixar fluir a paixão reprimida.

Já um ano, gasto em vão,
Pôde admirar a solução:
"Mal chego a abraçar alguém direito
E já se nota o meu defeito!
Todos os outros, ao fazê-lo,
Vão pelo lado direito, não o esquerdo!"

Que burrice!!
Tudo resumido a esta tolice.
"Sempre abraçava do lado errado.
Estava tudo acabado.
Que animalzinho mais imbecil!"
E reenviou-se à Puta Que o Pariu.
15\06\2009

História de um Brâmane

Encontrei nas minhas viagens um velho brâmane, homem bastante sábio, cheio de espírito e erudição;. de resto, era rico, e por isso mesmo ainda mais sábio; pois, como nada lhe faltasse, não tinha necessidade de enganar a ninguém. Seu lar era muito bem governado por três belas mulheres que porfiavam em agradar-lhe; e, quando não se divertia com elas, ocupava-se em filosofar.
          Perto de sua casa, que era bonita, bem ornamentada e cercada de encantadores jardins, morava uma velha hindu carola, imbecil e muito pobre.
          — Quem me dera não ter nascido! – disse-me um dia o brâmane. Perguntei-lhe por quê. – Há quarenta anos que estudo – respondeu-me – e são quarenta anos perdidos: ensino aos outros, e ignoro tudo; esse estado me enche a alma de tal humilhação e desgosto, que me torna a vida insuportável. Nasci, vivo no tempo, e não sei o que é o tempo; acho-me num ponto entre duas eternidades, como dizem os nossos sábios, e não tenho a mínima idéia da eternidade. Sou composto de matéria, penso, e nunca pude saber por que coisa é produzido o pensamento; ignoro se o meu entendimento é em mim uma simples faculdade, como a de marchar, de digerir, e se penso com a minha cabeça como seguro com as minhas mãos. Não só o princípio de meu pensamento me é desconhecido, mas também o princípio de meus movimentos: não sei por que existo. No entanto, cada dia me fazem perguntas sobre todos esses pontos; é preciso responder; nada tenho que preste para lhes comunicar; falo bastante, e fico confuso e envergonhado de mim mesmo após haver falado.
          O pior é quando me perguntam se Brama foi produzido por Vixnu, ou se ambos são eternos. Deus é testemunha de que nada sei a respeito, o que bem se vê pelas minhas respostas. “Ah! meu reverendo – imploram-me, – dizei-me como é que o mal inunda toda a terra”. Sinto-me nas mesmas dificuldades que aqueles que me fazem tal pergunta: digo-lhes algumas vezes que tudo vai o melhor possível; mas aqueles que ficaram arruinados ou mutilados na guerra não acreditam nisso, nem eu tampouco: retiro-me acabrunhado da sua curiosidade e da minha ignorância. Vou consultar nossos antigos livros, e estes duplicam as minhas trevas. Vou consultar meus companheiros: respondem-me uns que o essencial é gozar a vida e zombar dos homens; outros julgam saber alguma coisa, e perdem-se em divagações; tudo concorre para aumentar o doloroso sentimento que me domina. Sinto-me às vezes à borda do desespero, quando penso que, após todas as minhas pesquisas, não sei nem de onde venho, nem o que sou, nem para onde vou, nem o que me tornarei”
          O estado desse excelente homem me causou verdadeira pena: ninguém tinha mais senso e boa-fé. Compreendi que, quanto mais luzes havia no seu entendimento a mais sensibilidade no seu coração, mais infeliz era ele.
          Vi, no mesmo dia, a velha sua vizinha: perguntei-lhe se alguma vez se afligira por saber como era a sua alma. Nem chegou a entender minha pergunta: nunca na sua vida refletira um momento sobre um só dos pontos que atormentavam o brâmane; acreditava de todo o coração nas metamorfoses de Vixnu e, desde que algumas vezes pudesse conseguir água do Ganges para se lavar, julgava-se a mais feliz das mulheres.
          Impressionado com a felicidade daquela pobre criatura, voltei a meu filósofo e disse-lhe:
          — Não te envergonhas de ser infeliz, quando mora à tua porta um velho autômato que não pensa em nada e vive contente?
          — Tens razão – respondeu-me ele; – mil vezes disse comigo que seria feliz se fosse tão tolo como a minha vizinha, e no entanto não desejaria tal felicidade.
          Essa resposta me causou maior impressão que tudo o mais; consultei minha consciência e vi que na verdade também não desejaria ser feliz sob a condição de ser imbecil.
          Expus a questão a filósofos, e eles foram da minha opinião. “No entanto – dizia eu, – há uma terrível contradição nessa maneira de pensar”. Pois de que se trata, afinal? De ser feliz. Que importa, pois, ter espírito ou ser tolo? Mais ainda: aqueles que estão contentes consigo estão bem certos de estar contentes; mas aqueles que raciocinam não se acham tão certos de bem raciocinar. “É claro – dizia eu – que se deveria preferir não ter senso-comum, uma vez que este contribua, o mínimo que seja, para o nosso mal-estar.” Todos foram de minha opinião, e todavia não encontrei ninguém que quisesse aceitar o pacto de se tornar imbecil para andar contente. Donde concluí que, se muito nos importamos com a felicidade, mais ainda nos importamos com a razão.
          Mas, refletindo bem, parece uma insensatez preferir a razão à felicidade. Como se explica, pois, tal contradição? Como todas as outras. Aí há muito de que falar.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Sobre a Crítica

Criticar.
Qual o verdadeiro sentido da crítica?
Entendo a crítica tanto quanto entendo...
Sei lá.


As vezes rendo-me a idéias alheias sobre o tema.
Wilde disse que toda a crítica
é uma forma de autobiografia.


Toda a crítica reflete
a insatisfação do próprio crítico.
Todos criticamos e julgamos
pois a ninguém coube ser perfeito.


A crítica, as vezes, vem disfarçada.


Alguns tem até o verdadeiro desejo
de ajudar o criticado.


Porém, é um tanto estranho,
a mim, ao menos,
criticar ou ouvir uma crítica.
Quem poderia conhecer alguém melhor
do que a si próprio.
Ter-se-ia que ser muito estúpido.


Sei que, para criticar,
temos que acreditar.
Mas, a crença, é uma faca de dois gumes.
Uma moeda com duas faces.
O bem e o mal disputam cada passo do crente.


A confusão da discórdia, a Éris grega,
nos torna criativos, todo artista é confuso.
Quem está confuso não critica,
ou, logicamente, não deveria.
O confuso tende a perder tempo
fazendo o que ainda não foi feito.


A crítica vale tanto quanto o crítico
e o crítico vale tanto quanto
aquilo que pensa.
Esta sim, talvez, seja uma certeza.
Por isso eu adoro as críticas.