sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Corpo e Mente

O vazio da triste mente,
A abandonada mente,
Mente que pensa que pensa,
E só evapora e condensa,
Vai e vem com você
Dentro dela a dizer:
Agora está tudo bem
Eu sou sua também.

Mas o corpo, frustrado,
Que até então ficou calado,
Perguntou, com toda a arte:
E cadê a minha parte?!?!

E sem ter o que responder
(Já era!), não pude conter
Aquele estranho desejo
De ter mais que um beijo.
E o meu amor decidido
Tornou-me um bandido,
Ladrão de inocências.
Tempos de decadência.

Porém agora, realmente,
Não me sinto inocente,
Menos ainda culpado,
Apenas um tanto frustrado.
Que sentimento dura,
No perigo e sem cura?
Que tipo de amor resiste
Com a distância que existe
Entre aqueles que amam
Mas não se entregam?

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Pandora e Epimeteu

O dia amanhece e traz consigo a esperança.
A esperança nos torna novamente uma criança,
Apesar dos gregos, antigos sábios de outrora,
Terem colocado-a no fundo da caixa de Pandora.

Será que a esperança é o mal mais pesado
De todo aquele mal que havia lá guardado?
A beleza ilusória da esperança de fulano
Cedo ou tarde acabará ou estará acabando.

Mas, na hora, a esperança também consola,
Como bem percebeu minha amiga Pandora,
Presenteada por Hermes com mentira e traição,
E deu a esperança a Epimeteu, seu varão.

Adão e Eva dos antigos gregos místicos,
Sua união nunca contentou aqueles críticos,
Deuses e Titãns, como era o bom Prometeu.
A mesma velha estória: mais um que se perdeu.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Direções Opostas

Seus olhos trêmulos me diziam
tudo o que eu não queria ouvir.
Bem no fundo eles refletiam
Seu estranho desejo de partir.

A dura falsidade do seu abraço
Faziam sentir-me como um cactus.
O que houve com o belo laço
Que nos atou com desejos mágicos?

Simplesmente relaxou e caiu,
Despindo-nos daquela fantasia.
A porta daquele cinema se abriu,
Fez a luz levar toda a alegria.

Perdemos toda a nossa confiança.
O ser criador, este dito deus do amor,
Não tocou para a nossa bela dança,
Nos presenteou com o silêncio e a dor.

O último beijo foi-se naquela hora,
Num passado guardado em nós.
A ocupante deste coração foi embora,
Juntos, sentíamo-nos ainda mais a sós.

Mas, o rancor não é bom souvenir,
Deixemos este sentimento estragado.
Não temos culpa por querermos ir
Na direção oposta, e não lado a lado.

Cobrirei com um manto de desdém
O belo anjo que um dia amei.
Um dia sei que te esquecerei,
Com a ajuda da pura vergonha,
Mal de todo aquele que sonha
Tão alto que sempre acorda
A todos e a sí mesmo e cora.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Amor: A Criptonita Dos Poetas (Com Leila Maria)

O poeta voa aqui e acolá,
É o super-homem no ar,
Ele busca a beleza maldita,
O amor é a sua criptonita.
Tanto prazer, tanto carinho
E no fim acaba novamente sozinho,
Deslizando por rosas com espinhos,
Que o ferem e o faz sangrar.

De onde vem a beleza de amar?
Vem do vazio distante do não ser,
Da falta do que se pode querer,
De sí mesmo, do medo da solidão.
Esse alento não pode ser ilusão.
Vem da barreira que quando transposta se desfaz;
Dos embriagados amantes que sempre querem mais;
Da força e da coragem que eu tive de viver;
Das lágrimas que desaguam em dor no renascer.
E do mundo ilusório da mente solitária,
Da falta de uma ocupação primária
Que impede o corpo de abismar-se,
Dizendo para ele jogar-se.

Meu quarto mostra a desordem do meu eu.
Quero resgatar o que era meu!
Viajo ao passado tentando encontrar
Algo meia boca que ocupe o seu lugar.
Estar em qualquer quarto sem você
É pegar pena perpétua na prisão do querer.
O seu lugar é somente aqui do meu lado,
Todo o resto é apenas uma armadilha do passado.

O vazio que transponho
Reveste em flores o meu sonho
Tudo isso por um simples motivo,
Que um dia eu volte a me sentir vivo.
E que novamente me sinta forte,
Novamente saiba onde é o norte,
E não mais andar vagando por aí,
Sem destino, só a hora de partir.

O Romantismo

Como são ridículos, os românticos.
Nunca são capazes de conhecer a quem amam.
São como barcos a remo a trevessar o atlântico
Sem bússola, vela ou motor, só dores que o inflamam.

São pedaços humanos a vagar por entre seus entes
Sem nunca conhecê-los, nem mesmo sem querer.
Vivem apenas no vazio de suas próprias mentes,
Único lugar onde eles teem algum poder.

Tuberculosos, bêbados ou drogados, no século passado
Os românticos atuais são suas imitações baratas.
O romântico ama e nunca pode ser amado.
O romantismo é o anzol das mulheres ingratas.

Discípulos de Platão, negadores da realidade,
Caixões vazios enterrados no céu azul sangrento -
Isso é ser romântico - o resto é só vaidade.
O romantismo dita os versos que invento.

sábado, 22 de outubro de 2011

Novo Rumo

Quando o olhar distante,
Finalmente,
Traz a resposta
Da difícil pergunta apresentada
E nos mostra
A direção a seguir
É esta a verdadeira hora de partir...

...E traçar um novo rumo.


Não fique parado tentando ser bom
Corra, caia, levante e seja muito melhor.

Tome o seu caminho e corra,
Corra até cansar e cair
E descansar
E levantar
E sacudir
A poeira
E respirar fundo
E correr novamente
Até ter em sua frente
O que deseja,
onde quer que esteja!!!

A tristeza
É a mala mais pesada,
Dizem que sabe o povo.
Toma o teu sabre tolo
E toma o que é teu,
Com o poder 
Que o seu
Deus te deu.


- Tão simples assim?
 Sim!

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Barganha Poética

Ah, belo astro de luz insuperável,
Toma-me com o teu calor vivificante,
Faz a minha vontade implacável
Brilhar como o seu semblante.

Magnífico astro imponente e sisudo,
Taga até mim teus raios epifânicos
Com o poder de revelar quase tudo,
Separe todos os maus e inflame-os.

Aqueça o ar que me enche os pulmões,
Conduza-me na direção certa de andar
E livre meu pobre barquinho dos furacões
Que aqui, acolá, insiste em nos açoitar.

Livra-me da cegueira involuntária,
Mal de todo sempre velho romântico!
Esta poesia não era para ser hilária!
Traz-me alguém em troca deste cântico!

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Amores Reais (Versos Doloridos)

A verdadeira bondade
Somente priva da liberdade
Quem já não tem onde agarrar-se.

O amante perfeito,
Que ama de qualquer jeito,
Não enxerga defeito.
Leva sempre o amor preso no peito,
Não isolada ao seu lado.

Privar alguém da liberdade é o maior pecado.

As paixões que machucam os corações
Não passam de dolorosas ilusões.

O perdão...
Pode ser apenas fraqueza de opinião.

Encontrar no mundo um só sentimento verdadeiro,
Não apenas uma farsa ou mais um duro cativeiro
É como procurar um alfinete neste mundo inteiro.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Letras Verdes

Repentinamente acordei...
Sonhei com um belo anjo.
Diante dele me ajoelhei,
Guardei na mente seu arranjo.

Era a visão mais perfeita
O seu belo corpo parte nú.
Parecia que ela era feita
Numa quimera ao céu azul.

E disse estas palavras:
"Estou aqui para protegê-lo
Das suas paixões malvadas,
trazer-te um pouco de zelo.

"Sou a inocência que chora;
Sou um espírito de puro amor.
Estou aqui com você agora,
Vou ajudá-lo a livrar-se da dor."

E dizendo palavras tais
Tomou conta do meu coração.
Fê-lo bater em espaços iguais
De tempo, evitando explosão.

E então, eu chorei.
Chorei como nunca antes.
Por que chorava? Não sei...
Alegrias, coisas marcantes...

Banhado em lágrimas, soluçava.
E o meu anjo a me olhar.
Onde será que ela estava
Antes de vir me encontrar?

E então, ele perguntou:
"Agora você sente-se melhor?"
- Bem, a minha dor passou!
"Então, agora vem o pior."

Num piscar de olhos ligeiros
O meu anjo foi-se, embora
Meus agradecimentos lisonjeiros
Estivessem saindo na hora.

Mas, então, vi na parede,
Uma grande frase de fora a fora.
A perfeita caligrafia dizia em verde:
"A vida recomeça a toda hora!!"

O Corvo (The Raven) por Machado de Assis e Fernando Pessoa

Tradução de Machado de Assis:

Em certo dia, à hora, à hora
Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
Ao pé de muita lauda antiga,
De uma velha doutrina, agora morta,
Ia pensando, quando ouvi à porta
Do meu quarto um soar devagarinho,
E disse estas palavras tais:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
Há de ser isso e nada mais."

Ah! bem me lembro! bem me lembro!
Era no glacial dezembro;
Cada brasa do lar sobre o chão refletia
A sua última agonia.
Eu, ansioso pelo sol, buscava
Sacar daqueles livros que estudava
Repouso (em vão!) à dor esmagadora
Destas saudades imortais
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora.
E que ninguém chamará mais.

E o rumor triste, vago, brando
Das cortinas ia acordando
Dentro em meu coração um rumor não sabido,
Nunca por ele padecido.
Enfim, por aplacá-lo aqui no peito,
Levantei-me de pronto, e: "Com efeito,
(Disse) é visita amiga e retardada
Que bate a estas horas tais.
É visita que pede à minha porta entrada:
Há de ser isso e nada mais."

Minh'alma então sentiu-se forte;
Não mais vacilo e desta sorte
Falo: "Imploro de vós, — ou senhor ou senhora,
Me desculpeis tanta demora.
Mas como eu, precisando de descanso,
Já cochilava, e tão de manso e manso
Batestes, não fui logo, prestemente,
Certificar-me que aí estais."
Disse; a porta escancaro, acho a noite somente,
Somente a noite, e nada mais.

Com longo olhar escruto a sombra,
Que me amedronta, que me assombra,
E sonho o que nenhum mortal há já sonhado,
Mas o silêncio amplo e calado,
Calado fica; a quietação quieta;
Só tu, palavra única e dileta,
Lenora, tu, como um suspiro escasso,
Da minha triste boca sais;
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
Foi isso apenas, nada mais.

Entro co'a alma incendiada.
Logo depois outra pancada
Soa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ela:
"Seguramente, há na janela
Alguma cousa que sussurra. Abramos,
Eia, fora o temor, eia, vejamos
A explicação do caso misterioso
Dessas duas pancadas tais.
Devolvamos a paz ao coração medroso,
Obra do vento e nada mais."

Abro a janela, e de repente,
Vejo tumultuosamente
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
Não despendeu em cortesias
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
De um lord ou de uma lady. E pronto e reto,
Movendo no ar as suas negras alas,
Acima voa dos portais,
Trepa, no alto da porta, em um busto de Palas;
Trepado fica, e nada mais.

Diante da ave feia e escura,
Naquela rígida postura,
Com o gesto severo, — o triste pensamento
Sorriu-me ali por um momento,
E eu disse: "O tu que das noturnas plagas
Vens, embora a cabeça nua tragas,
Sem topete, não és ave medrosa,
Dize os teus nomes senhoriais;
Como te chamas tu na grande noite umbrosa?"
E o corvo disse: "Nunca mais".

Vendo que o pássaro entendia
A pergunta que lhe eu fazia,
Fico atônito, embora a resposta que dera
Dificilmente lha entendera.
Na verdade, jamais homem há visto
Cousa na terra semelhante a isto:
Uma ave negra, friamente posta
Num busto, acima dos portais,
Ouvir uma pergunta e dizer em resposta
Que este é seu nome: "Nunca mais".

No entanto, o corvo solitário
Não teve outro vocabulário,
Como se essa palavra escassa que ali disse
Toda a sua alma resumisse.
Nenhuma outra proferiu, nenhuma,
Não chegou a mexer uma só pluma,
Até que eu murmurei: "Perdi outrora
Tantos amigos tão leais!
Perderei também este em regressando a aurora."
E o corvo disse: "Nunca mais!"

Estremeço. A resposta ouvida
É tão exata! é tão cabida!
"Certamente, digo eu, essa é toda a ciência
Que ele trouxe da convivência
De algum mestre infeliz e acabrunhado
Que o implacável destino há castigado
Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
Que dos seus cantos usuais
Só lhe ficou, na amarga e última cantiga,
Esse estribilho: "Nunca mais".

Segunda vez, nesse momento,
Sorriu-me o triste pensamento;
Vou sentar-me defronte ao corvo magro e rudo;
E mergulhando no veludo
Da poltrona que eu mesmo ali trouxera
Achar procuro a lúgubre quimera,
A alma, o sentido, o pávido segredo
Daquelas sílabas fatais,
Entender o que quis dizer a ave do medo
Grasnando a frase: "Nunca mais".

Assim posto, devaneando,
Meditando, conjeturando,
Não lhe falava mais; mas, se lhe não falava,
Sentia o olhar que me abrasava.
Conjeturando fui, tranqüilo a gosto,
Com a cabeça no macio encosto
Onde os raios da lâmpada caíam,
Onde as tranças angelicais
De outra cabeça outrora ali se desparziam,
E agora não se esparzem mais.

Supus então que o ar, mais denso,
Todo se enchia de um incenso,
Obra de serafins que, pelo chão roçando
Do quarto, estavam meneando
Um ligeiro turíbulo invisível;
E eu exclamei então: "Um Deus sensível
Manda repouso à dor que te devora
Destas saudades imortais.
Eia, esquece, eia, olvida essa extinta Lenora."
E o corvo disse: "Nunca mais".

“Profeta, ou o que quer que sejas!
Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
Onde reside o mal eterno,
Ou simplesmente náufrago escapado
Venhas do temporal que te há lançado
Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
Tem os seus lares triunfais,
Dize-me: existe acaso um bálsamo no mundo?"
E o corvo disse: "Nunca mais".

“Profeta, ou o que quer que sejas!
Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta, atende, escuta, atende!
Por esse céu que além se estende,
Pelo Deus que ambos adoramos, fala,
Dize a esta alma se é dado inda escutá-la
No éden celeste a virgem que ela chora
Nestes retiros sepulcrais,
Essa que ora nos céus anjos chamam Lenora!”
E o corvo disse: "Nunca mais."

“Ave ou demônio que negrejas!
Profeta, ou o que quer que sejas!
Cessa, ai, cessa! clamei, levantando-me, cessa!
Regressa ao temporal, regressa
À tua noite, deixa-me comigo.
Vai-te, não fique no meu casto abrigo
Pluma que lembre essa mentira tua.
Tira-me ao peito essas fatais
Garras que abrindo vão a minha dor já crua."
E o corvo disse: "Nunca mais".

E o corvo aí fica; ei-lo trepado
No branco mármore lavrado
Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
Um demônio sonhando. A luz caída
Do lampião sobre a ave aborrecida
No chão espraia a triste sombra; e, fora
Daquelas linhas funerais
Que flutuam no chão, a minha alma que chora
Não sai mais, nunca, nunca mais!


 Tradução de Fernando Pessoa:

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de alguém que batia levemente a meus umbrais.
"Uma visita", eu me disse, "está batendo a meus umbrais.
                 É só isto, e nada mais".

Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão!) a amada, hoje entre hostes celestiais —
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
                 Mas sem nome aqui jamais!

Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundido força, eu ia repetindo,
"É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
                 É só isto, e nada mais".

E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
"Senhor", eu disse, "ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi..." E abri largos, franqueando-os, meus umbrais.
                 Noite, noite e nada mais.

A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais —
Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.
                 Isso só e nada mais.

Para dentro então volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
"Por certo", disse eu, "aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais."
Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.
                 "É o vento, e nada mais."

Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre os meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais,
                 Foi, pousou, e nada mais.

E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
"Tens o aspecto tosquiado", disse eu, "mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais."
                 Disse o corvo, "Nunca mais".

Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos meus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,
                 Com o nome "Nunca mais".

Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, "Amigo, sonhos — mortais
Todos — todos já se foram. Amanhã também te vais".
                 Disse o corvo, "Nunca mais".

A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
"Por certo", disse eu, "são estas vozes usuais,
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
                 Era este "Nunca mais".

Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,
                 Com aquele "Nunca mais".

Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sobras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sobras desiguais,
                 Reclinar-se-á nunca mais!

Fez-se então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
"Maldito!", a mim disse, "deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!"
                 Disse o corvo, "Nunca mais".

"Profeta", disse eu, "profeta — ou demônio ou ave preta!
Fosse diabo ou tempestade quem te trouxe a meus umbrais,
A este luto e este degredo, a esta noite e este segredo,
A esta casa de ânsia e medo, dize a esta alma a quem atrais
Se há um bálsamo longínquo para esta alma a quem atrais!
                 Disse o corvo, "Nunca mais".

"Profeta", disse eu, "profeta — ou demônio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais.
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!"
                 Disse o corvo, "Nunca mais".

"Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!", eu disse. "Parte!
Torna à noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!
Tira o vulto de meu peito e a sombra de meus umbrais!"
                 Disse o corvo, "Nunca mais".

E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha cor de um demônio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão há mais e mais,
                 Libertar-se-á... nunca mais!

Lar Sem Muros

A tristeza é minha maior fonte de inspiração.
Palavras dançam quando me aperta o coração.
A felicidade, ilusão, nunca me incomoda à porta,
A esperar, não sei como o meu corpo suporta.

O meu lar sem muros nunca pôde ser pichado.
O vento é o dono de tudo o que tenho alugado.
Meu coração vazio bate e bate e bate entorpecido
Quando a ressaca não me deixa totalmente fudido.

Minhas veias doem, falta calor neste sangue sem cor.
O desejo de extinção segue-me para onde eu for
E meus únicos remédios são-me sempre negados.
Escrever é o que tenho para pagar meus pecados.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Misteriosas Paisagens

As misteriosas paisagens são as mais encantadoras.
A lua, nosso grande astro das noites mais promissoras,
Nem toda noite está lá, a emitir o seu brilho vulgar.
Um dia cheia, minguando até a nova lua que crescerá,
Que esconde eternamente um lado aos olhos do chão,
É a rainha do mórbido e do amante, do doente e do são.

Temos de andar vestidos na revelante e relevante luz,
A escuridão permite-nos a liberdade, ficarmos nus.
No escuro encontra abrigo a presa exitada e atenta.
No escuro Deus se revela e o Diabo, infeliz, atenta,
O precavido treme e infarta e o artista inventa.

sábado, 1 de outubro de 2011

Oração dos Internautas

Deus, por favor, ouça esta oração:
Livra-nos da queda em nossa conexão;
Do erros bobos em nossos downloads;
... Dos spans e das falhas nos modens.

Fazei a gata que estou teclando responder;
Impeça que ela encontre algo melhor para fazer.
Permita-nos um encontro perfeito em pessoa;
Permita também que ela seja muito boa (pessoa).

Livra-nos dos trojans, malwares e outros nomes;
Fazei com que o meu crack funcione;
Permita-nos usar a rede mundial para o bem;
Faça com que ela nos dê algum lucro também.
AMÉM!!!!